Iole de Freitas
Curadoria
Mônica Zielinsky, Paulo Sergio Duarte e Sônia Salztein
06.ago
08.fev.09
O Programa Átrio inaugura uma nova série de exposições na Fundação Iberê Camargo. Através dessas intervenções, expande-se o campo de atuação e de difusão em arte contemporânea, uma proposta presente desde o próprio processo de montagem: realizada diante dos olhos do público, a obra vai ganhando corpo dia após dia, abrindo o espaço no qual está inserida a novas interpretações. Mais do que aproximar público e obra, essa interação sugere uma saudável familiaridade com os caminhos da criação artística. Uma interação que também é diálogo: situada no espaço privilegiado do átrio, a obra cria uma ponte entre o projeto de Álvaro Siza e os artistas em exposição.
Com esta primeira intervenção, assinada por Iole de Freitas e proposta por Mônica Zielinsky, Paulo Sergio Duarte e Sônia Salzstein, a Fundação propõe ao público uma renovação contínua da percepção de seu espaço, trazendo-o ainda mais ao centro das discussões em arte.
Desde o início da década de 1970, o trabalho de Iole de Freitas se faz num prolífico entrecruzamento de linguagens, em que a tradição da escultura, revisitada sob as formas mais heterodoxas, vê-se crucialmente problematizada à luz dos destinos contemporâneos da técnica, dos procedimentos e materiais impessoais – e cada vez mais virtuais – que a tecnologia faz intervir na prática da arte, como em todos os ramos da atividade humana. Pode-se afirmar, aliás, de cada uma das produções da artista, das primeiras às mais recentes, que sua lida com materiais e processos dirá sempre algo da aventura de estirar a um ponto extremado e dramático os padrões de cálculo, resistência e eficiência próprios aos fatos da tecnologia, o que é decerto um triunfo do prazer do jogo, do vai-e-vem amoroso da construção e desconstrução sobre a previsibilidade e o finalismo.
Filmes super-oito, fotografias, relevos, esculturas, instalações, intervenções espaciais de escala arquitetônica, desenhos, maquetes – são estas as formas flutuantes e intercambiáveis que o trabalho da artista tomou no curso das últimas quatro décadas, todas elas marcadas por procedimentos tão simples e clarividentes como dobrar, tensionar e rearranjar superfícies em novos e surpreendentes equilíbrios. Em todas encontramos a idéia de se transpor limites, a experiência do movimento não como rotineiramente se o concebe – como desdobramento sucessivo na extensão –, mas como propagação e adensamento de forças, um tangenciar contínuo de fronteiras ainda intocadas. Em todas essas produções, além disso, adivinhamos a mesma questão de fundo: a aspiração a uma dês automatização dos gestos corrompidos pelo hábito e pela acomodação, a busca, enfim, de uma escala feliz na relação do corpo humano com o espaço.
É talvez nesta obra, produzida especialmente para o átrio do edifício da Fundação Iberê Camargo projetado por Álvaro Siza, que se expõe de modo mais pleno, como jamais havia ocorrido antes na obra de Iole de Freitas, a alegria de se levar aos limites as possibilidades expressivas do movimento, um compartilhar desta generosa arquitetura que é tanto de encontro como de recolhimento ativo, sem, no entanto, abrir mão da complexidade e singularidade expressivas do corpo em seus embates com os espaços públicos da cidade contemporânea.
Sônia Salzstein
Imagem: Vista parcial da exposição “Iole de Freitas”, que esteve em cartaz na Fundação Iberê Camargo de 06 de agosto de 2008 a 08 de fevereiro de 2009. Foto © Fabio Del Re_VivaFoto