Continuum

Curadoria

Henrique Menezes

17.fev

25.fev.18

Ocupando o terceiro andar da Fundação Iberê Camargo, a exposição temporária Continuum apresenta projeções que engendram imaginários utópicos, nos quais uma visualidade surreal contamina as obras e suas imagens — fluída transposição de um pensamento a outro, de sentimentos a sensações.

A expressão “continuum” descreve um todo que, mesmo afetado por possíveis fragmentações e limites, mantém-se uno. Partindo de operações efêmeras, as narrativas simulam ações sem fim, repetitivas e melancólicas em sua inocuidade. As obras de videoarte de Ana Rito, Cezar Sperinde, Leonardo Remor e Denis Rodriguez revelam alegorias meditativas que sintetizam instantes, nos quais a concisão deriva em encantamento visual: a presença da ação artística contrasta com a substância material, diluindo-se, amalgamando-se e hipnotizando.

A obra Pleura (2015), da artista portuguesa Ana Rito (Lisboa, 1978), abre o percurso do visitante ditando o tom da mostra através de sua sutileza estética. A corrente de um rio passa tranquilamente por uma escultura clássica imóvel. A obra evidencia o fluxo do sensível, numa permanente evocação do tempo e da finitude. Nas palavras do crítico João Silvério, a poética de Ana Rito nos dá a sentir “a aura luminosa das imagens, as sombras, os sons e as palavras que se configuram numa corporalidade que resgata a matéria possuída pelo ânimo da imagem em movimento e pela sua operatividade enquanto referência ou memória”.

Continuum é conexão sem interrupção. A artificialidade presente em Pleura flerta com a obra Pindorama – dancing palm trees (2014), de Cezar Sperinde (Porto Alegre, 1981). A projeção em grande formato é o registro de uma performance do artista em Londres, onde imensas palmeiras infláveis agitam-se em frente a colunas de uma imponente construção neoclássica. Este oásis alegórico, inusitado e anacrônico, explora reflexões sobre identidades e arquiteturas, em análises sociais e históricas que tocam o choque das experiências culturais contemporâneas. A similitude das obras extrapola a harmonia visual: a construção poética do efêmero, perseguida também em Cinema é Cachoeira (2015), reitera um impulso ilusório. A obra de Leonardo Remor (Getúlio Vargas, 1987) e Denis Rodriguez (São Paulo, 1986) encerra o gesto artificial em uma miragem de ritmo constante e de eterno recomeço. É um paralelo entre o looping do filme e o fluxo contínuo da água que corre em uma escadaria – inspirado em uma citação de Humberto Mauro.

O efêmero se reconstitui em Continuum, colocando em jogo sua essência: flagrantes sucessivos daquilo que o tempo poderia turvar mas o gesto artístico captura, recitando a potência do instante.

Henrique Menezes

 

Imagem: Vista parcial da exposição “Continuum”, que esteve em cartaz na Fundação Iberê Camargo de 17 a 25 de fevereiro de 2018. Foto © Samuel Gambohan

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