O estranho desaparecimento de Vera Chaves Barcellos

Curadoria

Raphael Fonseca

06.maio

30.jul.23

Oitenta e cinco anos não são oitenta e cinco dias. Esta exposição é uma celebração da artista Vera Chaves Barcellos. Nascida em Porto Alegre, sua pesquisa tem coesão e solidez ímpares, que a tornam fundamental para as artes visuais no Brasil. Mais do que isso, sua trajetória possibilita cruzamentos com discussões históricas e mais recentes sobre arte e imagem na região da América Latina e, de forma ampla e irrestrita, globalmente.

Com uma investigação que se inicia ao final dos anos 1950, Vera Chaves Barcellos experimenta diversas tecnologias, em especial aquelas que dizem respeito à repetição, serialização e uso de técnicas industriais. Como o público poderá ver neste átrio, além de no terceiro e no segundo pavimentos da Fundação Iberê, gravuras, livros, fotografias e vídeos são as mídias centrais de sua prática. Jogando com sequências de imagens, a artista desafia a máxima matemática: a ordem dos fatores altera o produto? Como uma série de imagens pode enunciar e, ao mesmo, confundir a noção de uma narrativa única?

Entre o onírico e o político – e quase sempre por meio da junção entre ambos os aspectos –, diversas obras da artista foram divididas por oito salas deste edifício, trazendo uma narrativa baseada em uma sucessão de trabalhos que vai, aproximadamente, da década de 1960 àqueles feitos especialmente para a exposição. Acreditamos que, desta forma, o público consegue acompanhar as formas como a artista respondeu a diversas inovações tecnológicas pelas quais a humanidade passou – da invenção da televisão ao surgimento do Photoshop.

Por fim, o título desta exposição se apropria, com certa liberdade poética, do nome de um trabalho da artista aqui incluído e datado de 1976: “O estranho des-aparecimento de VCB”. Naquele contexto histórico – o da ditadura militar no Brasil – o título poderia ser lido tanto como uma amarga memória às pessoas que desapareceram devido à violência estatal, quanto uma provocação em referência àqueles que tiveram de, momentaneamente, desaparecer do cenário brasileiro por perseguição política.

Batizando esta retrospectiva e ocupação de todo este prédio – que inclui, no quarto piso, em paralelo, uma curadoria da artista em torno de obras de Iberê Camargo –, essa frase ganha outro contexto e é embebida de ironia: VCB, ou seja, Vera Chaves Barcellos, não desapareceu – está viva, extremamente ativa e colaborativa em seus projetos. Por enquanto podemos rir do seu desaparecimento; ao mesmo tempo, melancolicamente, sabemos que um dia ele, assim como o de todos nós, chegará.

Não nos desesperemos – enquanto tivermos sua obra e pesquisa perante os nossos olhos, VCB, felizmente, nunca desaparecerá.

Raphael Fonseca
Curador

 

Imagem: Vera Chaves Barcellos, “O estranho des-aparecimento de VCB”, 1976/2020 (detalhe). Foto © Acervo FVCB

 

Minidocumentário sobre a exposição:

 

Conversa sobre a exposição, entre o curador Raphael Fonseca e a artista Vera Chaves Barcellos, mediada pelo historiador e crítico de arte Eduardo Veras:

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