Iberê, 1987
óleo sobre tela
78 x 55 cm
Acervo Fundação Iberê

Tombo P188

Foto © Fundação Iberê

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“Como modelo me transmuto em forma. Sou, então, pintura. Ao me retratar, gravo minha imagem no vão desejo de permanecer, de fugir ao tempo que apaga os rastros. O autorretrato é uma introspecção, um olhar sobre si mesmo. É ainda interrogação, cuja resposta é também pergunta. Essa imagem que o pintor colhe na face do espelho, ou na superfície tranquila da água, – penso no Narciso de Caravaggio – revela como ele se vê e como olha o mundo. […]
O autorretrato é ainda o encontro do pintor consigo mesmo. […] Não tenho presente quantos autorretratos pintei. Se retratar-se revela narcisismo, todos os pintores o são. Na sucessão de minha imagem no tempo, ela se deteriora como tudo que é vivo e flui. […]”

LAGNADO, Lisette. Conversações com Iberê Camargo. São Paulo: Iluminuras, 1994. p. 31-32. (Fala de Iberê Camargo).

 

“Com Iberê, o corpo-a-corpo do pintor com a tela talvez atinja sua máxima significação. A acumulação de matéria, as raspagens e incisões por um lado; por outro, a construção-desconstrução de signos, que criam camadas sucessivas, que se escondem uns por baixo dos outros; e, ainda, as acumulações de cores, que vem do fundo, que se modificam sucessivamente, cada vez mais sombrias (talvez, pela própria acumulação), que criam e recriam nuances, sutilezas, muitas vezes por obra do acaso – reações plásticas e/ou químicas de cores sobrepostas e justapostas. Razões internas da própria pintura.
O corpo da pintura não é passivo: carne, osso, pele, sangue. Corpo que possui, também, suas próprias leis, não biológicas, mas plásticas. ‘As formas e cores mais premeditadas, quando se concretizam sobre a tela, são sempre surpresas.’ E o primeiro a surpreender-se é, sempre, o pintor. O quadro se autogera até certo ponto, o pintor descobre, incessantemente, a pintura, e se descobre na pintura.
‘Desejo atingir uma coisa simples, atingir a boa forma com economia de traços. Mas o simples não nasce logo. A matéria tem que virar víscera, para depois ser. Tudo nasce da dor’.”

CATTANI, Icleia Borsa. In: BERG, Evelyn. Iberê Camargo: coleção contemporânea 1. FUNARTE, Instituto Nacional de Artes Plásticas/ Museu de Arte do Rio Grande do Sul: Rio de Janeiro, 1985. p. 51.