Estudo de figurino para o papel de trombeteira no balé Rudá, c.1959
grafite e lápis de cor sobre papel
35,1 x 25,3 cm
Acervo Fundação Iberê
Tombo D3107
Foto © Fabio Del Re_VivaFoto
“No sonho de Villa-Lobos, a união da América Latina viria de suas nações indígenas: maias, incas e astecas em confraternização com os marajoaras; mulheres amazonas dominando os homens das tribos vizinhas e fazendo o amor triunfar nos trópicos. Na sinopse do balé ‘Rudá’, de 1951, que ele nunca chegou a encenar, o maestro deu forma ao sonho. As cores viriam mais tarde, pelas mãos de Iberê Camargo, que projetou cenários e figurinos da obra. […]
[…] Iberê pintou personagens típicos das lendas amazônicas, como o Boitatá, a Iara ou Cobra Grande, o Saci e o Lobisomem. Nos cenários, florestas se misturam às pirâmides, construções típicas das tribos da América Espanhola. […]
A pesquisadora Maria Augusta Machado, uma das maiores especialistas na obra de Villa-Lobos, diz que não é possível saber com exatidão o que aproximou o compositor de ‘O trenzinho caipira’ de Iberê, na época um dos professores do Instituto Municipal de Belas Artes, mais tarde transformado na Escola de Artes Visuais do Parque Lage.
– Villa-Lobos era amigo de muitos pintores, principalmente de Di Cavalcanti, mas não se sabe o que o uniu a Iberê – diz ela. – O certo e que a série de guaches foi feita quando o maestro já estava muito doente ou até morto (Villa-Lobos morreu em novembro de 59, de câncer). Iberê pode ter atendido a um pedido de Villa, trabalhado por conta própria ou até por solicitação de uma instituição oficial, interessada em tirar “Rudá” do papel depois da morte de seu autor.
Também é certo que a grande epopéia tropical de Villa-Lobos, exuberante em personagens (mulheres sensuais e guerreiras dominam o primeiro e segundo atos) e ambientes (ora selvas, ora suntuosos palácios pré-colombianos) foi virada pelo avesso por Iberê. A explosão de cores amazônicas ganhou tons soturnos, uma das marcas registradas do pintor.
[…]
Nos arquivos do Museu Villa-Lobos, há documentos que mostram a gênese do balé. Com sua letra um tanto quanto caótica, Villa-Lobos explica na curta sinopse do espetáculo – concebido para ser encenado em 38 minutos – que Rudá é o deus do amor na mitologia marajoara. E compara a epopéia indígena que está propondo a episódios bíblicos: ‘A Bíblia nos ensina o amor simbolizado pela criação de Deus em Adão e Eva. Em todas as manifestações de vida o amor predomina. A Terra dividiu-se em continentes, mas a Humanidade conservou o amor. Considero Rudá, deus do amor na mitologia Marajoara, também como símbolo desse sentimento de todas as civilizações pré-colombianas no Novo Continente (…) Fixei entre os Marajoaras o episódio culminante da vitória do amor nos trópicos, movido pela sedução do Vale do Amazonas’.”
NAME, Daniela. O sonho latino de Iberê e Villa-Lobos: guaches inéditos feitos pelo pintor para “Rudá”, balé que o maestro nunca montou, vão a leilão: O Globo, Rio de Janeiro, jun. 1999. 1 p.