Ilustração para o conto À beira da lagoa, 1988
tinta de esferográfica e nanquim sobre papel
33,4 x 22 cm
Acervo Fundação Iberê
Tombo D3032
Foto © Fabio Del Re_VivaFoto
Desenho elaborado para ilustrar o conto “À beira da lagoa”, escrito por Iberê Camargo e publicado em 1988 pela editora L&PM no livro “No andar do tempo: 9 contos e um esboço autobiográfico”:
À beira da lagoa
“Num fim da tarde, encontrei na rua da Praia um velho conhecido, meu colecionador, segundo disse, que me perguntou se minha permanência em Porto Alegre era definitiva.
– Sim, estou radicado em Porto Alegre, embora ainda mantenha no Rio apartamento e ateliê montados. Conservo meu navio de caldeira acesa, sempre pronto para zarpar. Assim estou aqui e estou lá, quase simultaneamente.
Depois de uma pausa olhando em torno, acrescentei:
– Escuta, tu não achas isto aqui muito parado?
– Sim e não. Foi sempre assim. Isto aqui é província – acrescentou.
– Onde está a Editora Globo, a Casa Masson das joias caras, dos relógios de grandes marcas? Por onde andam as gurias bem vestidas, enchapeladas, as mulheres elegantes, de gosto refinado? E o Bromberg, e todas aquelas casas tradicionais? – acrescentei.
Agora, um calçadão que virou ponto de camelôs, vendedores de chinelos, de bolas, de mapas, de cintos, o diabo!
– Sim, sim, mas isto aqui é província.
Despedi-me do amigo lembrando minha conversa com um sapo à beira de uma lagoa:
– Sapo, tu não achas essa água muito parada?
– Parada? Isto é assim, isto é uma lagoa.
Afastei-me, ouvindo-o dizer:
– Esse velho sempre com a mania de mar.”
Porto Alegre, setembro de 1986
“O leitor […] terá, neste conjunto de nove contos, um novo aspecto da sensibilidade de Iberê Camargo. […] Se, como diz Iberê, vida e arte não se separam, sem dúvida os contos que agora temos neste volume iluminarão partes da vida e da pintura deste artista excepcional, responsável, entre outros, pelo surgimento do Atelier Livre de Porto Alegre, escola livre que formou alguns de nossos mais importantes artistas plásticos a partir da década de 60, fato que ele, humildemente, não revela no seu depoimento, ou preferiu esquecer, mas que lhe devemos, de qualquer maneira.”
Antonio Hohlfeldt, na apresentação do livro No andar do tempo: 9 contos e um esboço autobiográfico, 1988