A história das obras de Iberê na Organização Mundial da Saúde em Genebra
“Você, ao ver por primeira vez um gato, se surpreendeu? Aceita as árvores? Acostume-se com as novas formas criadas, elas enriquecem o mundo. Além do mundo de Deus existe o mundo do artista”.
Essa era uma das respostas de Iberê Camargo, quando as pessoas se aproximavam para perguntar o que representava aquele gigantesco mural que pintava no hall de entrada na nova sede da Organização Mundial da Saúde (OMS) em Genebra. Outra resposta, menos didática, e igual em auto referência, era: “não representa, é”.
Uma das instituições criadas no segundo pós-guerra (1947), no contexto da reconstrução e da reorganização do mapa político internacional, a OMS recebeu doações de todos os países membros para construir e equipar a sua sede na Suíça. O Brasil, por meio do Ministério de Relações Exteriores, ofereceu um presente cultural: uma pintura original que Iberê realizaria in loco. “Pintar o painel é um desafio. Vou operar o rei”, disse o artista, em entrevista ao O Globo.
Foram quatro meses de trabalho em uma pintura 49 metros quadrados. Para criar uma “vegetação colorida”, Iberê realizou uma série de esboços e começou a brincar livremente com as formas. Formas presas, debaixo do emaranhado de gestos que as levaram a sua dissolução: pássaros, carretéis, dados, vórtices.
A realização do painel não parece ter sido fácil para Iberê. Na imprensa reclamou do pó da construção do prédio que impossibilitou iniciar a pintura na data prevista, dos andaimes que não permitiam ver plenamente a evolução da obra e do frio que congelava as mãos. Em cartas que dona Maria, esposa de Iberê, escrevia aos familiares no Brasil, falava do enorme esforço que o artista realizava pintando, inclusive, até altas horas da noite.
A obra foi inaugurada no dia 23 de maio de 1966. “Empreguei todos os meus esforços para realizar uma obra digna do Brasil”, destacou Iberê na época.
Porão dos guardados (de Iberê)
Por mais de 40 anos, a Organização das Nações Unidas guardou em seus porões uma caixa lacrada com o inédito projeto de Iberê Camargo, que só poderia ser aberta pelo diretor da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Nessa caixa havia 30 estudos feitos com grafite, guache, grafite, lápis de cor, nanquim, tinta a óleo e outros materiais, com a seguinte mensagem do próprio artista escrita na tampa: “Não dobre e não remova nada sem a autorização do diretor-geral.”
Esses estudos só foram descobertos em 2007, após uma consulta da Fundação Iberê, a pedido de Maria Coussirat Camargo. “Quando fomos contactados, estranhamos o pedido, pois de fato ninguém nunca havia ouvido falar nisso. Mas depois fomos investigar e encontramos uma caixa com desenhos e rascunhos inéditos de Iberê”, contou Fadela Chaib, porta-voz da OMS.
A caixa foi aberta em janeiro de 2008, na presença de autoridades da Organização Mundial da Saúde, incluindo a então diretora-geral, a chinesa Margaret Chan. Uma parte foi cedida em empréstimo para uma a exposição do centenário de nascimento de Iberê, em 2014, na Fundação Iberê. Hoje, encontram-se preservados no Arquivo da OMS, em Genebra, como parte do presente do governo brasileiro.
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