Liberdade em movimento

Curadoria

Jacopo Crivelli Visconti

30.maio

10.ago.14

Adotado esporadicamente desde a década de 1920, o caminhar se consolida e é difundido como prática artística a partir do final dos anos 60, mais ou menos no mesmo período em que a Internacional Situacionista e seu mâitre a penser Guy Debord, autor do clássico Teoria da deriva, abandonam a atividade artística em favor de um engajamento político explícito e militante, motivado pelos acontecimentos de 1968. Próximas das derivas situacionistas, as ações dos artistas que, ao redor do mundo, se lançam a andar sem muito mais do que “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça” (como diria em âmbito brasileiro e de uma perspectiva distinta, mas de certa maneira complementar, Glauber Rocha) buscavam consolidar a ideia de uma arte não comercializável, que pudesse minar as bases da sociedade capitalista recusando a obrigação de produzir obras tangíveis e vendáveis. Em alguns casos, essas ações se opunham diretamente ao clima político em que foram concebidas, mas logo o “campo expandido do movimento” se firmou em contextos menos conflituosos, resistindo como técnica artística até os dias de hoje, apesar das mudanças do clima político.

O conflito entre a unicidade e a efemeridade da ação e o registro que, apesar de incompleto, é o que sobra dela e passa a ser conhecido pelo público constitui, sem dúvida, uma das idiossincrasias mais fascinantes e inegáveis do âmbito do movimento. Qualquer relato ou registro de uma ação é, por sua própria natureza, parcial, já que condensa algo muito maior: uma ação com uma determinada duração no tempo e extensão no espaço, um desenvolvimento, um acúmulo de experiências. Ao trabalharem frequentemente com materiais frágeis e em constante transformação (gelo, neve, areia, terra, etc.), os artistas evidenciam essa condição, ao passo que apontam para a possibilidade de se criar laços mais duradouros, e uma noção de comunidade real e profunda, exatamente através do momento, do ato, do movimento que precisam ser vivenciados e experimentados. A disposição para entregar o aspecto final da obra ao acaso, pelo viés da intervenção mais ou menos direta dos outros, confirma o desinteresse dos artistas aqui reunidos para um objeto artístico convencional, perfeitamente acabado. Mesmo quando acontece em completa solidão, mais do que produzir algo novo essas ações visam à fusão do artista com o espaço, à simbiose com a sociedade. As trilhas espontâneas que se formam, em Brasília, em aberta contraposição e contravenção ao traço livre e poético, mas raramente prático, de quem desenhou a capital, sintetizam perfeitamente essas considerações: o movimento é o caminho para a liberdade.

Jacopo Crivelli Visconti

 

Imagem: Abertura da exposição “Liberdade em movimento”, que esteve em cartaz na Fundação Iberê Camargo de 30 de abril a 10 de agosto de 2014. Foto © Nilton Santolin

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