Nathalia Timberg e Hamilton de Holanda revisitam Iberê Camargo

Roberta Amaral
21.abr.20

Dois grandes nomes da arte mergulharam na vida e obra de Iberê Camargo. A atriz Nathalia Timberg e o bandolinista Hamilton de Holanda apresentaram uma performance na Fundação Iberê Camargo para empresários, colecionadores de arte e apoiadores. A dupla trouxe à tona percepções de Iberê sobre seu processo criativo, suas pinturas e o cotidiano. Ou, como traduziu a própria intérprete, os textos eram “confidências do artista com sua arte e do homem com sua vida”.

Um dos momentos que mais emocionou Nathalia foi a homenagem à Maria Camargo, a guardiã do legado de Iberê e a mulher que idealizou o centro cultural.

Nascida em 28 de novembro de 1915, em Porto Alegre, Maria Camargo formou-se professora na Escola Sevigné e, por se destacar nas aulas de desenho, foi aceita na antiga Escola de Belas Artes, atual Instituto de Artes da UFRGS. Lá, obteve a graduação em pintura e estudou com grandes professores da época, como ngelo Guido, Francis Pelichek, Luis Maristany de Trias, Fernando Corona, José Lutzenberger e João Fahrion.

Foi em 1939 que Iberê Camargo a conheceu, sua colega em uma aula de História da Arte. Em novembro, eles se casaram. Reconhecendo o talento do marido, Maria começou cedo a guardar seus desenhos e o acompanhou nas mudanças e viagens que a carreira de pintor exigiria.

No Rio, enquanto Iberê estudava pintura, ela atuava como desenhista de arquitetura na Companhia Pederneiras. Mas também organizava os materiais de pintura do marido e fazia às vezes de agente. Também foi conselheira de Iberê, opinando sobre suas pinturas e sendo retratada em várias delas.

Durante os 54 anos em que esteve ao lado do pintor, Maria manteve uma série de cadernos nos quais anotou títulos, dimensões, datas, preços e nomes de compradores de pinturas e gravuras – documentos que hoje fazem parte do acervo documental.

Do momento da institucionalização do centro cultural até o fim da construção, Maria acompanhou todos os detalhes, foi presente e, até o fim de sua vida (2014), se emocionou com tudo que deixou para a história da arte.

Iberê escreve para Maria (1940)
“Quando eu estiver deitado na planície, indiferente às cores e às formas, tu deves te lembrar de mim. Aí, onde a planície ondula, a terra é mais fértil. Abre-se com a concha da tua mão uma pequenina cova e esconde nela a semente de uma árvore. Eu quero nascer nesta árvore, quero subir com os seus galhos até o beijo da luz. Depois, nos dias atrasados, tu virás procurar a sua sombra, que será festa para ti. Então, no murmúrio das folhas, eu te direi o que meu pobre coração de homem não soube dizer.”

Maria escreve para Iberê (1985)
“Sigo-te passo a passo, quase como tua sombra. Há mais de 40 anos, dividimos alegrias e tristezas. Entre nós, tudo foi e é repartido. Teu mundo tornou-se meu mundo. Teus amigos são meus amigos. Tuas preocupações também são as minhas preocupações. Iberê, temos um só coração, um só modo de sentir o mundo. Nunca te vi esmorecer. Sempre trabalhaste com a paixão dos escolhidos. Não te poupaste para alcançar o absoluto na arte. Acompanhei tuas noites insones, frente à tela, no frenesi da criação. Tu sempre te deste inteiro. Sem descanso, dias e anos, te aprofundaste mais e mais nessa tua busca sem fim. Eu te vi tempestuoso e, também, paciente na vigília do ácido que modelava as tuas imagens interiores, sempre com originalidade e poesia. Essa tua força e essa tua versatilidade me fascinam. Sinto-me feliz em ser a tua companheira e compartilhar a tua caminhada.”

 

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