Obra rara de Iberê Camargo doada por colecionador vai à leilão

28.ago.20

Um colecionador de São Paulo doou à Fundação Iberê uma raridade de Iberê Camargo, intitulada “Sol vermelho” (1951). Trata-se de um óleo sobre tela de 47 x 56 cm, que retrata uma vista de Santa Teresa na época em que o pintor viveu no Rio de Janeiro, após seu período de estudos na Europa. A pintura, agora, se junta às mais de 150 obras que vão à leilão virtual da instituição, nos dias 9 e 10 de setembro, às 19h, pelo site www.santayana.com.br.

“Sol vermelho” foi umas das obras da exposição O “outro” na pintura de Iberê Camargo, realizada entre junho de 2012 e março de 2013. O recorte da curadora Maria Alice Milliet explorou a emergência de uma duplicidade na obra do pintor. “O que se pretende não é esclarecer uma ambiguidade pessoal de Iberê, mas explorá-la em sua obra. Busca-se mostrar o outro lado da imagem estereotipada que o público tem de sua pintura – um ‘rio de águas turvas’. Na poética do artista, as operações de ordem plástica nunca estiveram desvinculadas da angústia existencial”, destaca no catálogo da mostra. 

Quem conhece os quadros pastosos e agressivos de Iberê não faz ideia do quanto se dedicou a copiar os antigos. Encheu cadernos com anotações, desenhos e observações sobre obras consagradas. De volta ao Rio, a correspondência que manteve com um antigo aluno, o cineasta e amigo Mário Carneiro, revelava o quanto se empenhara em apurar a qualidade artesanal da fatura. Para obter determinado resultado num quadro ou gravura, ele não hesitava em recorrer ao saber codificado, às velhas receitas, aos segredos de ateliê. 

Na Itália, Iberê estudou também com Giorgio de Chirico, em quem encontrava estímulo e inspiração. Milliet comenta: “A par do aproveitamento técnico, vários testemunhos atestam a ocorrência de traços da estética do mestre, tanto nos quadros quanto nos escritos ficcionais do discípulo. O contato com a pintura metafísica fez reviver no pintor mais jovem um sentimento de nostálgica solidão, algo já experimentado nos confins de Restinga Seca, onde nasceu. Das paisagens silenciosas da pintura metafísica, Iberê iria reter o estranhamento produzido pelo vazio das ruas e praças, a sensação de solidão e a nostalgia do passado. Das ruas desertas do bairro carioca de Santa Teresa às paisagens desoladas de sua última produção, há um traço em comum: melancolia.”

O poeta das ruas, das vielas silenciosas do Rio
“De 1945 a 1959, mais ou menos, fui o poeta das ruas, das vielas silenciosas do Rio, antes que essa se tornasse uma cidade assolada pela violência”, disse Iberê. A atuação de Iberê incluía o ensino de pintura e gravura e protesto contra as dificuldades e os altos custos para se importar tintas, papéis e equipamentos necessários ao exercício da profissão. Ficou conhecido por essa luta que apelidou de “guerra dos cem anos”, devido à permanente carência de material artístico de qualidade no mercado brasileiro. 

Pensando suprir as poucas opções de ensino técnico profissionalizante, fundou, em 1953, o Curso de Gravura em Metal no Instituto Municipal de Belas-Artes do Rio de Janeiro. Sua intenção era socializar o conhecimento adquirido nas aulas de Carlo Alberto Petrucci, na Calcografia Nazionale di Roma, que frequentara em 1948, e do muito que aprendera observando os mestres como Dürer, Rembrandt e Goya nos museus da Europa. De Roma e das viagens guardou cadernos minuciosamente anotados e ilustrados dos quais se serviu para elaborar o manual “A gravura”, destinado primeiramente a seus alunos e, mais tarde, publicado em livro.

Leilão virtual
O catálogo completo para lances nas obras do leilão virtual da Fundação Iberê está disponível aqui. Com valores a partir de R$ 200 e possibilidade de pagamento em até dez vezes no cartão de crédito, toda a renda será destinada à manutenção da instituição e futuras exposições e ações educativas.

Para mais informações sobre a obra, acesse aqui o Google Arts & Culture.