sem título, c.1961
esmalte cerâmico sobre prato de porcelana industrial
24,3 x 24,3 cm
Acervo Fundação Iberê

Tombo O010

Foto © Fabio Del Re_VivaFoto

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“Analisando o conjunto da produção de Iberê Camargo, o crítico Paulo Herkenhoff faz a seguinte consideração: ‘Iberê pinta como pintor, desenha como desenhista e grava como gravador. (…) Cada técnica é trabalhada com justeza no seu campo de tensão próprio. (…) Sempre abraçou outros múltiplos suportes que lhe são oferecidos: biombo, louça, cerâmica, tapeçaria, saia, camiseta, macacão, faixas, outdoor. Enfim, pode pintar tudo: como se o mundo pudesse (ou devesse) ser uma grande pintura…’.
A cerâmica foi um desses suportes sobre o qual Iberê produziu muitas pinturas, num curto espaço de tempo. A Fundação tem registros fotográficos de 60 peças […]. Realizados, majoritariamente, sobre porcelana industrial, os trabalhos, datados de 1960, 1961, 1964 e 1965, revelam que o artista soube explorar muito bem o campo de tensão próprio dessa técnica, experimentando possibilidades temáticas e estilísticas que iria desenvolver na pintura.
O primeiro grupo de trabalhos produzidos por Iberê reúne as peças datadas de 1960 e 1961, que foram realizadas com o acompanhamento da ceramista Luiza Prado. As tintas usadas no processo de pintura em porcelana são à base de minerais, suas cores e texturas são modificadas quando submetidas ao forno, e a temperatura e o tempo de queima têm que ser exatos. Assim, os conhecimentos técnicos são indispensáveis para produzir esse trabalho. […]
Numa de suas frases favoritas, Iberê dizia: ‘Não nasci para enfeitar o mundo’, e suas pinturas em porcelana certamente passam bem longe de propostas decorativas. […] Em algumas peças, o artista imprime ritmo e dinamismo com o uso do scratch, o risco seco, a retirada da tinta com o cabo do pincel, técnica que, até então, usara pouco, mas que viria a tornar-se uma marca de sua pintura. […]
Ainda no início da década de 1960, Luiza Prado deixa Porto Alegre e Iberê retoma a produção de cerâmicas com Marianita Linck. […]
As cerâmicas produzidas em 1965 espelham a temática e a questão matérica que passa a dominar a obra de Iberê a partir desse período. São trabalhos empastados, pintados com grossas camadas de esmalte cerâmico, cuja espessura o fogo não perdoa. Durante a queima, a tinta estoura, formando bolhas, asperezas e texturas, que se espalham nas superfícies dos pratos. Impregnadas na porcelana como vibração e movimento, essas explosões são imediatamente acolhidas por Iberê, em uníssono com sua produção pictórica.
O conjunto é a última experiência conhecida de seu trabalho em cerâmica, mas a amizade com Marianita Linck permanecerá até à morte do artista.”

MATTAR, Denise. In: POSSAMAI, Gustavo (Org.). Iberê Camargo: o fio de Ariadne. Fundação Iberê Camargo: Porto Alegre, 2020. p. 13-14. (Observar notas na fonte).