Retrato (Jane e Mariza), 1987
óleo sobre tela
184 x 129,5 cm
Acervo Fundação Iberê

Tombo P074

Foto © Fundação Iberê

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“[…] Essa decantação da forma em muitas águas, isso tanto nas palavras, como nas linhas, na pintura, é uma depuração, uma síntese que leva por assim dizer a uma transfiguração que está além da aparência. Importante é encontrar a magia que existe nas coisas, na vida. Do contrário, seria apenas um testemunho visual de um fenômeno ao alcance de qualquer um. Acho que o pintor tem uma capacidade, digamos, de penetração além do modelo. Num determinado momento, o modelo não tem mais importância, ele que foi tão importante para a estruturação do quadro. Surge uma outra figura que nem mais está no ateliê, é um outro espaço.”

LAGNADO, Lisette. Conversações com Iberê Camargo. São Paulo: Iluminuras, 1994. p. 28. (Fala de Iberê Camargo).

 

“[…] O que significa a obra na tela? Em certo sentido, a obra já está na tela quando a vemos em exibição, mas não é mais a tela e nem mesmo o tempo do pintor que está sendo exposto. E nem a tela neste caso também é uma coisa. Quando o pintor adianta-se para ela, um universo em turbilhão já lhe aparece. Este pode ser um território da história da arte, de modo que o pintor pode pensar por suas figuras esquematizadas. A tela entranha estas figuras e resiste. O pintor apaga as imagens, recomeça. Por vezes, quando existe um modelo (uma sessão para Iberê pintar um retrato pode durar cinco horas), a sua transferência para a tela nunca é um símile. Dessimetria com a semelhança, a obra opera na tela uma unidade transformadora que só pertence a ela. A tela é, antes de tudo, um fundamento e retoricamente um abismo. A tela começa a ser abismal, algo que é necessário ultrapassar. Um abismo significa algo sem fundo, assombroso, o extremo, mas também abertura, sulco natural. Um fundamento que é uma abertura, um sulco natural: é a tela iberiana. O seu estatuto é o de ser um abismo. A esta metáfora geográfica junta-se outra, que a integra na ação: a épica especial da matéria. E por aí que começa a dramaticidade da obra iberiana. Mas a noção puramente geográfica desaparece quando diríamos que ‘alguém está à beira do abismo’, isto é, alguém corre algum perigo. A tela iberiana é contaminada por esta metáfora: como abismo ela é uma infinitude: atrai o pintor para a vertigem de uma prolongada ferida. E, como imagem retórica, é aberta como uma ferida. […]”

COUTINHO, Wilson. Melancolia do Moderno. In: BERG, Evelyn. Iberê Camargo: coleção contemporânea 1. FUNARTE, Instituto Nacional de Artes Plásticas/ Museu de Arte do Rio Grande do Sul: Rio de Janeiro, 1985. p. 75.